Otávio Pinto e Silva explica como empresas e trabalhadores enfrentam essa situação e quais são os direitos desses profissionais
A síndrome de burnout envolve uma ideia de esgotamento mental do trabalhador – Foto: Pressfoto/Freepik / Divulgação Jornal da USP
De acordo com dados da Associação Nacional de Medicina do Trabalho (Anamt), aproximadamente 30% dos trabalhadores brasileiros sofrem com a síndrome de burnout, uma doença ocupacional reconhecida e classificada pela Organização Mundial da Saúde (OMS) em 2022. Atualmente, o Brasil é o segundo país com mais casos diagnosticados no mundo.
Otávio Pinto e Silva, professor do Departamento de Direito do Trabalho e Seguridade Social da Faculdade de Direito da USP, explica como empresas e trabalhadores enfrentam essa situação, quais são os direitos desses profissionais e como as empresas podem realizar uma prevenção.
A DOENÇA
A síndrome de burnout envolve uma ideia de esgotamento mental do trabalhador, condição na qual o profissional tem dificuldade em realizar suas tarefas e chega muito próximo a um estado de depressão. De acordo com Silva, se as empresas não estiverem preparadas para lidar com essa situação, podem não entender o que o trabalhador está sentindo e colocá-lo em uma situação muito pior. Além disso, a situação é delicada para o próprio profissional, que fica com dificuldade de se relacionar com seus colegas, com seus chefes, e esse cenário pode repercutir até mesmo dentro da sua própria casa.
Como o burnout foi reconhecido como uma condição ocupacional, os procedimentos tomados depois do diagnóstico são iguais aos de qualquer outra doença. Segundo o professor, os primeiros 15 dias de afastamento compõem um período em que o trabalhador fica afastado e a responsabilidade pelo pagamento desses dias continua sendo da própria empresa. A partir do 16º dia, se há a necessidade de permanência desse afastamento, a responsabilidade passa a ser do INSS, que terá que pagar um benefício previdenciário, o auxílio-doença. ”Muitas vezes, as empresas se preparam para esse cenário, porque não querem ter sua força de trabalho afastada e muito menos ter que pagar para ele durante esse período em que ele está afastado”, explica o professor.
A fim de prevenir essas questões de forma bem estruturada, as empresas buscam oferecer uma assistência prévia para esse trabalhador. Hoje é muito comum, como Silva comenta, que os planos de saúde ofereçam atendimentos psicológicos. É importante, entretanto, que um diagnóstico seja feito com antecedência para evitar que ocorra o afastamento do profissional.
Os departamentos de recursos humanos das empresas precisam estar preparados para enfrentar essas situações, para conseguir estabelecer um ambiente de trabalho saudável. “Muitas vezes, o trabalhador tem uma reação de ficar mais calado, introvertido, e tem até vergonha de expor aquilo que está passando.” Por isso, como pontua o professor, as empresas precisam conseguir identificar essas situações, para oferecer apoio para o trabalhador enfrentar a doença. “Todo mundo pode passar por isso um dia, então é muito importante que a empresa tenha esse ambiente adequado para poder enfrentar essas eventuais situações”, aponta.
QUESTÕES JURÍDICAS
“Toda vez que o trabalhador está afastado em razão de uma doença, seu contrato de trabalho fica interrompido durante esse período”, esclarece o professor. Dessa forma, o profissional não pode ser afastado de seu cargo. Depois da finalização do período de tratamento necessário, o trabalhador pode retornar às atividades. Muitas vezes, entretanto, a empresa pode ficar insatisfeita com o prestador de serviço, alegando que ele não tem mais condições de oferecer seu trabalho de maneira regular e produtiva, e opta pela dispensa do trabalhador. Este pode ficar inconformado com a decisão empresarial e decidir apresentar o caso à Justiça do Trabalho, a fim de retornar para seu cargo. Alguns prestadores de serviço, inclusive, ajuízam uma ação e solicitam uma indenização, alegando que a síndrome de burnout foi desenvolvida no trabalho por conta da forma como foram tratados pelo empregador.
Segundo o professor, esse é um processo muito delicado, porque é preciso realizar um exame psíquico para diagnosticar a condição do trabalhador. “Muitas vezes, isso vai demandar, por exemplo, um laudo pericial ao longo do processo, que será feito por um psicólogo ou psiquiatra, e que auxiliará o juiz a obter informações técnicas que expliquem a situação profissional daquele trabalhador.” Assim, o magistrado pode deliberar, em uma sentença judicial, se o profissional faz jus, ou não, a uma indenização que pleiteia.
Como explica o professor, essa temática ainda não está consolidada, porque as situações experienciadas e apresentadas pelos profissionais são muito diferentes entre si. Cada indivíduo reage de uma forma à doença, às dificuldades vivenciadas no dia a dia, o que resulta na dificuldade de estabelecer um quadro preciso.
A Justiça também se depara com a mesma dificuldade no momento de julgamento de uma causa: se existe ou não a síndrome de burnout, o direito a uma indenização e se as questões psicológicas têm relação direta com questões trabalhistas.
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Noticia retirada do site do Jornal da USP