Fernando Bellissimo Rodrigues avalia que a oferta de diagnóstico e tratamento pelo SUS é essencial para o combate desse avanço das infecções sexualmente transmissíveis
No SUS existem pelo menos duas ISTs que são imunopreveníveis: a hepatite B e a infecção pelo HPV – Fotomontagem com imagens de Pixabay e Wikimedia Commons / Jornal da USP
Nos últimos anos, alguns especialistas vêm apontando um aumento nas taxas de Infecções Sexualmente Transmissíveis (ISTs) entre os grupos mais jovens. Pesquisas apontam também para um aumento geral desse fator na sociedade como um todo, contudo, entre os indivíduos de 15 a 24 anos, foi possível notar uma relação direta entre essa elevação e o abandono do uso de preservativos. Uma das infecções que apresentaram um dos crescimentos mais elevados desde 2019, por exemplo, foi a sífilis, que contava com uma taxa de ocorrência de 59,1 casos a cada 100 mil, e que evoluiu para 78,5 em 2021, de acordo com o Ministério da Saúde.
Fernando Bellissimo Rodrigues, infectologista e professor da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (FMRP), explica que os motivos para esse crescimento são multifatoriais, ou seja, não há um único fator que possa explicar a elevação desses dados.
CAUSAS
Entre os diferentes fatores que se relacionam com esse aumento, ele destaca a proliferação das redes sociais e das interações virtuais entre os jovens. “Com esses mecanismos, aumenta-se a probabilidade de encontrar parceiros ou parceiras com as mesmas afinidades que você. Há 30 anos, uma pessoa que quisesse ter relações sexuais com outra tinha que sair e, ao acaso, encontrar uma pessoa compatível com esses desejos. Hoje isso ficou facilitado com a questão das redes sociais”, aponta o médico.
Assim, Bellissimo diz que esse fator pode estar colaborando com o aumento do número de parceiros entre os indivíduos — ocasionando também o aumento da probabilidade de que algum desses parceiros tenha algum patógeno, afetando diretamente a frequência de transmissão.
Além disso, a redução do uso de preservativos destaca-se como uma das maiores problemáticas dentro desse debate. “É patente por diversos estudos, levantamentos e questionários feitos em diferentes populações no mundo todo que os jovens de hoje usam menos frequentemente preservativos do que usavam os jovens de dez, 15 e 20 anos atrás”, adiciona o especialista. Dessa forma, com o advento da aids na década de 80, o uso de camisinhas se tornou muito frequente nos anos 80 e 90. Contudo, a partir de 1996, com o surgimento da terapia antirretroviral — que transformou a história da infecção pelo HIV, fazendo com que ela deixasse de ser eminentemente fatal, tornando-se uma infecção crônica tratável —, o medo das ISTs tornou-se menor e gerou uma redução do uso de preservativos.
A Profilaxia Pré-Exposição ao HIV (PrEP HIV), novo método de prevenção à infecção pelo HIV, que, de acordo com Bellissimo, deveria ser tomada em conjunto com o preservativo para evitar a infecção, tem sido utilizada em substituição ao uso de camisinhas. Assim, inúmeros jovens utilizam a medicação para evitar a contração dessa infecção, mas acabam contraindo outras, como a sífilis, a gonorreia, a clamídia, o papilomavírus (HPV) e outras.
MEDIDAS PREVENTIVAS
Medidas preventivas podem ser adotadas para evitar as ISTs. Entre elas, o professor aponta a importância de levar a educação sexual para as escolas, sendo necessário incluir as informações essenciais ao currículo estudantil para que crianças e pré-adolescentes possam compreender a importância do tema antes de iniciarem a sua vida sexual.
Bellissimo avalia, dessa forma, que o poder público apresenta um papel central na promoção da educação sexual tanto nas escolas públicas como nas escolas privadas e também na divulgação de campanhas que estimulem o uso de preservativos. “Esses são alguns dos pontos que precisam ser abordados amplamente para a contenção e a prevenção dessas doenças. A oferta de serviços de tratamento também é de suma importância, porque as pessoas, enquanto não se tratam, podem transmitir as ISTs, assim, a oferta de diagnóstico e tratamento pelo Sistema Único de Saúde (SUS) é essencial”, complementa o especialista.
O surgimento da terapia antirretroviral transformou a história da infecção pelo HIV – Foto: Wikimedia Commons / Jornal da USP
A vacinação é outro ponto essencial nesse debate; atualmente, no SUS, existem pelo menos duas ISTs que são imunopreveníveis: a hepatite B e a infecção pelo HPV — fornecidas gratuitamente à população. A Profilaxia Pré-Exposição ao HIV, quando utilizada da maneira correta, também é um grande contribuinte da prevenção e, por fim, destaca-se o uso dos preservativos, que se apresentam como uma medida amplamente efetiva contra todas as infecções.
Outro ponto essencial para a compreensão do tema é a identificação dos sintomas das ISTs. Assim, nota-se que eles são apresentados de forma diferente em cada um dos patógenos, sendo comum observar a presença de ardor ao urinar, febre, o surgimento de feridas e verrugas na região genital e o aparecimento de ínguas na região inguinal. Além disso, em alguns casos, as infecções passam anos de forma silenciosa — como acontece com a hepatite B e o HIV.
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Por Julia Galvao
Sob supervisão de Paulo Capuzzo
Matéria retirada do site do Jornal da USP