08/12/2021

Medicamento para câncer desenvolvido na Unicamp tem patente concedida nos EUA

A tecnologia foi licenciada com exclusividade para a spin-off NanoImmunotherapy Pharma, formada por docentes e pesquisadores da Unicamp. Concessão norte-americana pode acelerar estudos em fase clínica.


Uma tecnologia para o tratamento de câncer desenvolvida inteiramente na Unicamp obteve patente nos Estados Unidos pelo USPTO (United States Patent and Trademark Office). Um pedido de patente também foi depositado pela Agência de Inovação Inova Unicamp no INPI (Instituto Nacional da Propriedade Industrial), no Brasil, e EPO (European Patent Office), escritório de patentes da Europa, ambos em fases avançadas de exame.


O OncoTherad (Oncology Therapy Adjuvant) é um imunoterápico que atua de modo complementar na melhora da resposta imunológica do paciente. Ele age por meio de dois mecanismos: por um lado, ativa as células de defesa para reconhecimento e ataque aos tumores; por outro, reduz a formação de metástase e de vasos sanguíneos que alimentam o câncer. Com isso, diminui também diminui a resistência dos tumores a tratamentos convencionais, como a quimioterapia. “Esse é um momento histórico para a ciência brasileira. A concessão americana da patente abre um leque de oportunidades. Entre as vantagens, está a possibilidade de pleitear o acesso a programas de aceleração de novas drogas na FDA, a agência reguladora norte-americana, além de abrir a interlocução com grandes companhias farmacêuticas internacionais”, diz Wagner José Fávaro, professor e pesquisador da Unicamp, e inventor da tecnologia.


Na primeira fase dos testes clínicos, o medicamento se mostrou seguro, eficaz e com poucos efeitos colaterais no combate a diferentes tipos de tumores, em especial o câncer de bexiga. Ele também foi testado em pacientes oncológicos que contraíram a COVID-19, apresentando resultados promissores. Recentemente, ganhou o Prêmio de Ciência da Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica.


Até o momento, 250 pacientes foram tratados com o nanofármaco sintético desenvolvido, com financiamento público, no Instituto de Biologia (IB) e no Instituto de Química (IQ). Os ensaios clínicos foram conduzidos no Hospital Municipal de Paulínia com pacientes oncológicos para os quais outras alternativas de tratamento já tinham sido esgotadas.


Resultados apresentados neste ano no 22º Congresso Brasileiro de Oncologia Clínica mostraram sucesso em 77,3% dos casos de câncer de bexiga tratados experimentalmente com o OncoTherad, sem reaparecimento do tumor. Nos 22,7% de casos em que o câncer voltou, o tamanho e o grau de agressividade da doença foram menores, evitando cirurgias para retirada da bexiga, muito frequentes em recidivas tumorais desse tipo.


DOCENTES EMPREENDEDORES


As pesquisas com o nanofármaco tiveram início em 2007 e seguiram uma trajetória pioneira incomum dentro da Universidade. O OncoTherad foi a primeira propriedade intelectual de titularidade da Unicamp licenciada com exclusividade para uma spin-off formada pelos inventores da patente, desde a aprovação da nova Política de Inovação da Unicamp, em 2019. Nessa modalidade, a NImm-Pharma é a única empresa que pode explorar o nanofármaco, uma vantagem competitiva no mercado. “Sempre escutei que o brasileiro não era capaz de fazer algo assim e nós conseguimos. A nova Política de Inovação da Unicamp permitiu que mudássemos o cenário burocrático. Agora, temos o controle da patente e, com isso, a possibilidade de articulação com outras empresas”, explica Nelson Durán, professor e pesquisador aposentado da Unicamp, inventor da patente e atual sócio administrador da NImm-Pharma.


Inicialmente, Favaro estudava o papel do sistema imunológico no câncer. A parceria com Durán, referência no Brasil em nanotecnologia, levou ao desenvolvimento da plataforma que permitiu criar em laboratório uma molécula sintética. O protocolo para o uso experimental em seres humanos foi submetido ao Conselho de Ética da Unicamp, após resultados positivos com baixa toxicidade em testes pré-clínicos e clínicos com animais. Os ensaios começaram em 2018 e foram acompanhados pelo médico urologista João Carlos Cardoso Alonso. Entre os primeiros pacientes, estavam tutores de alguns dos cães tratados inicialmente com a droga e que também lutavam contra o câncer.


O PAPEL DA SPIN-OFF


Empresa spin-off é uma empresa criada a partir de uma tecnologia desenvolvida em uma universidade ou instituto de pesquisa. O termo também é usado para empresas criadas dentro de outra empresa, quando esse gera um novo modelo de negócios, diferente daquele desenvolvido pela empresa mãe.


No caso das tecnologias universitárias, a spin-off tem um papel muito importante no amadurecimento das tecnologias, uma vez que aquelas criadas nas universidades estão geralmente num estágio embrionário e precisam de investimento para sua viabilização. Nessa fase, os investimentos podem ser públicos, por meio de programas como o Pesquisa Inovativa em Pequenas Empresas (PIPE) da Fapesp, ou privados, oriundos de investidores externos e do ecossistema empreendedor da Unicamp. “A função da empresa é vencer as etapas regulatórias. Estamos nos tornando produtores de um IFA (Insumo Farmacêutico Ativo) brasileiro para o tratamento de câncer. A universidade pública e toda sociedade civil irão se beneficiar disso, com o retorno do investimento feito ao longo dos anos na pesquisa”, diz Fávaro que é sócio cotista na NImm-Pharma.


Outro diferencial da tecnologia é que se trata de um medicamento com características de plataforma, ou seja, que pode ser adaptado para outras doenças. “O OncoTherad é um medicamento para o tratamento do câncer, mas desenvolvemos uma plataforma estrutural em podemos mudar características e fazer outros nanofármacos, com funções diferentes”, revela Durán.


O PAPEL DA UNIVERSIDADE


A abertura de empresas por docentes, pesquisadores e servidores da Unicamp para licenciar tecnologias da Universidade foi possível com a aprovação pelo Conselho Universitário (Consu), em 2019, da Política de Inovação da Universidade, que segue a Lei de Inovação Federal.


Com as mudanças, inventores, autores de patentes, programas de computadores e know how de titularidade da Unicamp podem, sem se afastar das atividades na Universidade, fazer parte de empresa de base tecnológica quando participam do quadro societário como acionista em funções técnicas não administrativas. É possível, ainda, dedicar-se exclusivamente à constituição de uma startup a partir do afastamento das atividades sem recebimento dos vencimentos referentes ao cargo.


O novo conjunto de regras também simplificou o processo de transferências de tecnologia da Unicamp nos casos de licenciamento com exclusividade, por meio da negociação direta com os interessados. A negociação é feita com a Inova Unicamp, responsável pela gestão do portfólio de tecnologias da Universidade. “Podemos citar uma série de benefícios para a Unicamp em parcerias como essa. A agilidade na transferência de tecnologia e o retorno em royalties para Universidade são alguns, mas o que queremos, acima de tudo, é colaborar para o desenvolvimento socioeconômico com base em conhecimentos científicos, estimulando docentes, pesquisadores e funcionários inventivos a fazer parte desse avanço tecnológico em todas as esferas”, disse Ana Frattini, diretora-executiva da Inova Unicamp.


Leia mais sobre a Política de Inovação da Unicamp


O imunoterápico ainda precisa ser testado em novos ensaios clínicos, realizados em diferentes centros de pesquisa (multicêntricos) com um número maior de pacientes. Para avançar para as próximas fases da pesquisa, a spin-off precisa montar uma estrutura fabril que siga as normas regulatórias da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) ou ter a produção negociada com uma indústria farmacêutica. Por enquanto, o OncoTherad não pode ser comercializado nem indicado para pacientes que não façam parte do estudo. “Estamos pleiteando esse medicamento para o câncer de bexiga refratário ao tratamento, uma condição médica não atendida no Brasil, pois a medicação que existe hoje não é eficiente e falta com frequência. Se o estudo regulatório comprovar a eficácia da imunoterapia, acreditamos que em três ou quatro anos o OncoTherad estará disponível no mercado”, finaliza Fávaro.


Notícia retirada do site do Jornal da Unicamp

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