19/11/2021

Exercício reabilita capacidade física e cardiorrespiratória após a covid

Estudo de caso descreve a recuperação de paciente submetida a um programa de treinamento após 71 dias de internação, intubação, disfunção renal, tromboembolismo pulmonar e parada cardiorrespiratória


 



Uma paciente grave de covid-19, de 67 anos, internada por 71 dias, sendo 49 em Unidade de Terapia Intensiva (UTI), teve sua capacidade física e cardiorrespiratória melhorada após um treinamento de exercícios físicos domiciliar (HBET). Ao sair do hospital, a mulher, uma ex-tabagista, apresentava quadro de fadiga, falta de ar, fraqueza muscular, mialgia (dor muscular), dores nas articulações, tonturas, formigamento, ansiedade e depressão.


O estudo de caso foi descrito no artigo pre-print (sem revisão de pares) Benefits of home-based exercise training following critical SARS-CoV-2 infection: a case study, na Research Square, por pesquisadores da Faculdade de Medicina da USP (FMUSP) e da Escola de Educação Física e Esporte (EEFE) da USP.


Segundo o artigo, os benefícios do exercício físico são amplamente conhecidos e têm sido considerados uma terapia de primeira linha em uma variedade de doenças e condições. No contexto da pandemia, programas de treinamento domiciliar foram bastante incentivados e foi demonstrado serem eficientes para melhorar os parâmetros relacionados à saúde e a aptidão das pessoas que precisaram ficar em casa.


“No entanto, faltavam evidências científicas sobre os benefícios do exercício físico como ferramenta terapêutica no tratamento de sobreviventes de covid. E foi essa aplicação que relatamos pela primeira vez nesse estudo”, explica ao Jornal da USP o professor Hamilton Roschel, coordenador do Grupo de Pesquisa em Fisiologia Aplicada e Nutrição da EEFE/FMUSP, pesquisador do Laboratório de Avaliação e Condicionamento em Reumatologia do Hospital das Clínicas (HC) da FMUSP e um dos autores do artigo.


PACIENTE GRAVE DE COVID-19


A paciente foi diagnosticada com covid-19 em 2020. Depois de dar entrada em um pronto-socorro paulistano, foi encaminhada ao Hospital das Clínicas da FMUSP, em virtude da evolução do quadro da doença. No HC, permaneceu internada por 71 dias, sendo 49 em UTI, período em que foi preciso ser submetida à ventilação mecânica invasiva. Desenvolveu disfunção renal e de múltiplos órgãos, tromboembolismo pulmonar e teve uma parada cardiorrespiratória, relata o estudo.




“Embora seja o relato de pesquisa de apenas um caso, a paciente era emblemática: além de idosa e atingir gravidade elevada da doença, ainda tinha comorbidades”, diz o pesquisador. Ela era hipertensa, sedentária, ex-fumante (fumou por dez anos embora estivesse há 25 sem fumar) e tinha hipotireoidismo.




Mesmo com esse histórico crítico, depois de algum tempo, a doença se estabilizou e a paciente recebeu alta com prescrição de oxigenoterapia domiciliar noturna por 30 dias. Depois de 12 semanas em casa, ela foi reavaliada por um médico e, após constatação de que não havia nenhum impedimento, a mulher começou o programa de exercícios, monitorado por um profissional de educação física membro da equipe de pesquisa, presencialmente ou por videoconferência.


“Embora seja o relato de pesquisa de apenas um caso, a paciente era emblemática: além de idosa e atingir gravidade elevada da doença, ainda tinha comorbidades”, diz o pesquisador. Ela era hipertensa, sedentária, ex-fumante (fumou por dez anos embora estivesse há 25 sem fumar) e tinha hipotireoidismo.


De acordo com o pesquisador, já se encontra em andamento um estudo clínico, randomizado, controlado, com um número maior de pacientes. Os resultados desse trabalho sairão em breve, diz.


 


TREINAMENTO PROPOSTO


 


O programa foi composto de três sessões semanais, incluindo exercícios aeróbicos, de fortalecimento e flexibilidade. As sessões aeróbicas consistiam em caminhadas, inicialmente em duas sessões de 10 minutos, de intensidade “muito leve” a “bastante leve”. Ao longo das semanas seguintes, houve progressão gradual em direção a uma única sessão de 45 minutos de caminhada de intensidade “um pouco difícil” a “forte”.


Já os exercícios de fortalecimento foram direcionados aos principais grupos musculares, utilizando materiais domésticos comuns como instrumentos (garrafa d’água, pacotes de mantimentos, cadeira, balde, dentre outros). As sessões consistiam em 3 a 4 séries por exercício com 10 a 15 repetições cada, intercalados por intervalos de recuperação.


RESULTADOS


REABILITAÇÃO CARDIORRESPIRATÓRIA


Os resultados se mostraram promissores, uma vez que “a paciente apresentou melhora em sua aptidão aeróbia (habilidade de fornecer oxigênio aos músculos e de utilizá-lo para gerar energia durante os exercícios) e eficiência de captação de oxigênio”, diz o pesquisador.


Antes do início da intervenção, a paciente apresentava prejuízo grave em sua capacidade funcional, com valores de consumo de oxigênio (VO2 – parâmetro utilizado para se avaliar a capacidade cardiorrespiratória e investigar problemas de saúde como as cardiopatias) bastante inferiores aos previstos para sua idade. Após dez semanas de treinos, foram observados aumentos no VO2 da paciente de praticamente 50%: de 10,61 para 15,38 mililitros por quilograma por minuto (ml/kg/min).


Além de melhorar a capacidade respiratória, a paciente também teve aumentada sua resistência ao esforço, ou seja, o tempo em que ela conseguia permanecer em exercício durante um teste específico: evoluindo de 5,5 minutos (330 segundos) para 8,5 minutos (510 segundos ), relata o artigo.


Quanto à avaliação de força e funcionalidade, também houve expressivas melhoras. Na avaliação feita antes e pós-treino, a força de preensão manual (avaliação que estima a força total do corpo a partir da capacidade de preensão com as mãos, simulando apertar um objeto) aumentou de 22 para 27 quilos; o desempenho do teste de sentar e levantar (que mede a força muscular dos membros inferiores e simula a tarefa de levantar-se e sentar-se repetidas vezes em uma cadeira ao longo de 30 segundos) aumentou de 14 para 16 repetições.


Por fim, de todos os sintomas pós-covid relatados pela paciente no momento da alta hospitalar, como fadiga, falta de ar, fraqueza, mialgia, dor nas articulações, parestesia (sensação de dormência ou formigamento de alguma parte do corpo), tontura, ansiedade e depressão, somente a ansiedade permaneceu após a intervenção.


O estudo foi realizado pelo Grupo de Pesquisa em Fisiologia Aplicada e Nutrição da EEFE/FMUSP, envolvendo pesquisadores da FMUSP (Igor Longobardi Amin, Bruno Gualano, Danieli Castro Oliveira de Andrade, Karla Goessler, Gersiel de Oliveira Júnior, Matheus Meletti, Danilo Marcelo Leite do Prado, Ítalo Lemes, Jhonnatan Santos) e da EEFE (Kamila Meireles, Alice Erwig Leitão, Fabiula Novelli) sob coordenação do professor Hamilton Roschel.


Mais informações: e-mail hars@usp.br, ou (11) 3061-8789 / 3091-8783, com o professor Hamilton Roschel.


Notícia retirada do site do Jornal da USP

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