Para Vania dos Santos, é preciso investir em pesquisas, na indústria farmacêutica e nos laboratórios nacionais, para que não fiquemos na dependência de fatores externos, sobre os quais não podemos interferir
Há falta de medicamentos essenciais como os antibióticos e a dipirona injetável Foto: Freepik / Jornal da USP
Atualmente, alguns medicamentos estão em falta no mercado brasileiro. Muitos, além de não estarem disponíveis nas farmácias, estão também sem previsão de reposição pelos laboratórios farmacêuticos. Esse cenário tem afetado a vida de brasileiros, como a da empregada doméstica Neide Aparecida Marcomini Grepi, que depende de uma medicação para o tratamento de reposição hormonal e não encontra mais o remédio para comprar.
“De três meses para cá, eu não encontro a medicação. Procurei a médica e ela me passou a segunda opção, que também não consegui encontrar”, queixa-se Neide, que conta que só conseguiu comprar uma terceira opção prescrita pela médica e, assim mesmo, precisou visitar várias farmácias antes.
“Infelizmente, o cidadão não tem muito a fazer nessa situação”, lamenta a professora Vania dos Santos, da Faculdade de Ciências Farmacêuticas de Ribeirão Preto (FCFRP), ao relatar que o problema tem afetado a população e os serviços de saúde de forma “muito intensa”. Como exemplo, a professora cita a falta de medicamentos essenciais como os antibióticos, “fundamentais em casos de infecções”, e a dipirona injetável, “muito utilizada em situações de febre e dor”, além de medicamentos oncológicos. Em hospitais, Vania diz que faltam anestésicos e relaxante muscular, utilizados pelos pacientes se recuperaram da anestesia pós-operatória, o que pode levar, até mesmo, ao adiamento de procedimentos cirúrgicos importantes, “colocando claramente em risco a vida das pessoas”.
Além dos impactos relacionados à saúde, a situação gera também outros transtornos aos consumidores. Neide conta que, agora, gasta o dobro com a nova medicação e as farmácias ainda não têm previsão se a medicação que tomava anteriormente vai voltar ao mercado.
FALTA INVESTIMENTO EM CIÊNCIA, PESQUISA E TECNOLOGIA
Vania afirma que o investimento nessa área “sempre foi insuficiente e, nos últimos anos, tem sido drasticamente diminuído”. Por isso, a solução para o Brasil, dependente de insumos estrangeiros, é investir em ciência, pesquisa e desenvolvimento tecnológico.
“É fundamental para o País e sua população que tenhamos o desenvolvimento de medicamentos que sejam voltados para a nossa realidade epidemiológica, portanto, para as nossas reais necessidades. Esse investimento é uma questão de soberania nacional, de forma a garantir os direitos especificados na Constituição Federal de 1988, a Constituição cidadã, que nos diz que saúde é direito de todos e dever do Estado”, defende a professora.
O QUE EXPLICA A FALTA DE MEDICAMENTOS
É fundamental para o País e sua população que tenhamos o desenvolvimento de medicamentos que sejam voltados para a nossa realidade epidemiológica – Foto: Freepick / Jornal da USP
O Brasil é dependente da produção farmacêutica de outros países e, em situação de desequilíbrio no cenário internacional, o acesso a medicamentos no País é diretamente afetado. “Dessa forma, o País corre um risco importante de desabastecimento quando há problemas no panorama internacional”, diz Vania.
Neste momento, o lockdown estabelecido na China, em decorrência da covid-19, e a guerra entre Rússia e Ucrânia comprometem a disponibilidade de medicamentos. Além disso, a professora informa que a recente greve em portos e aeroportos brasileiros também pode ter causado um atraso na liberação dos produtos. “Portanto, é cada vez mais importante que nós façamos uma reflexão sobre a necessidade do investimento nacional nas pesquisas e na indústria, nos laboratórios nacionais e nas universidades, no sentido de que possamos trabalhar em medicamentos para as nossas necessidades e que não fiquemos na dependência de fatores externos, sobre os quais nós temos poucas possibilidades de interferir”, completa Vania.
Ouça aqui a entrevista completa que foi ao ar no Jornal da USP
Notícia retirada do site do Jornal da USP