15/02/2022

Cientistas brasileiros desenvolvem stent que é absorvido pelo organismo

Estrutura retangular pequena de plástico que se assemelha a uma malha


 


A realidade imita a ficção. Isso mesmo, muitas das descobertas científicas que estamos vendo hoje parecem que saíram de filmes. É o caso da pesquisa do professor Marcelo Ganzarolli de Oliveira, do Instituto de Química da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), que há quase 30 anos estuda biomateriais que liberam o óxido nítrico (NO); uma pequena molécula responsável pela dilatação dos vasos sanguíneos e com ação cicatrizante. “Decidi reunir a minha experiência de pesquisa em polímeros com o que eu havia descoberto recentemente sobre o óxido nítrico no pós-doutorado, para inaugurar a pesquisa que desenvolvo até hoje”, conta o docente que começou o estudo em seu pós-doutorado na Inglaterra, ainda em 1994.


Os materiais poliméricos são extremamente versáteis e incluem desde polímeros com alta resistência mecânica até polímeros líquidos e os que formam géis. Podem também ser hidrofílicos e molháveis ou hidrofóbicos e repelentes à água. Muitos materiais de uso médico são feitos de polímeros. Por exemplo, cateteres, drenos, fios de sutura, telas, partes diversas de próteses, entre outros.


“Como o NO exerce várias ações potencialmente terapêuticas, e como eu vinha estudando a incorporação de moléculas na estrutura de polímeros desde o meu doutorado, a ideia de incorporar moléculas liberadoras de NO em polímeros de uso médico foi uma destas conexões de conhecimentos que acabamos fazendo quando estamos envolvidos com a Ciência”, complementa o professor Ganzarolli.


De acordo com o professor químico Marcelo Ganzarolli, um dos dispositivos implantáveis que demandam uma melhor performance eram os stents intracoronários, que são pequenas malhas metálicas expansíveis, introduzidas no interior das artérias coronárias para restabelecer o fluxo sanguíneo no coração, quando há obstruções causadas por formação de placas ateroscleróticas na doença arterial coronariana obstrutiva.


“Começamos, então, recobrindo stents metálicos com polímeros liberadores de NO. Mas, toda pesquisa enfrenta desafios desde o início. No nosso caso, um dos primeiros desafios foi conseguir os stents metálicos para fazer os recobrimentos. Os stents para uso médico são muito caros e precisávamos de muitas amostras. Através de uma colaboração que estabelecemos com o Instituto do Coração, Incor, da USP em São Paulo, juntamente com uma empresa brasileira de produtos médicos que estava interessada em comercializar stents, a Scitech, dentro de um projeto Finep, conheci o doutor Spero Penha Morato, que havia criado e empresa Lasertools e estava produzindo os primeiros stents metálicos cortados a laser, no Brasil. A partir da colaboração conjunta que estabelecemos, obter stents não foi mais um problema”, explica o cientista brasileiro.


Segundo o professor Ganzarolli, os primeiros polímeros utilizados para o recobrimento de stents eram embebidos com moléculas doadoras de NO. Numa segunda fase, passou-se a sintetizar polímeros que possuíam grupos funcionais doadores de NO ligados quimicamente nas cadeias poliméricas.




“Na fase atual, demos um grande passo e passamos a produzir stents inteiramente poliméricos, que não só liberam NO, mas que também se dissolvem lentamente após o implante, de forma a desempenharem sua ação terapêutica e, ao mesmo tempo, serem absorvidos pelo organismo, evitando-se, assim, complicações a longo prazo”, diz Ganzarolli.




O professor conta que isso só foi possível após vencer um outro desafio importante: o de como fabricar estes stents, que são malhas muito delicadas com geometrias complexas. “Isso só se tornou possível quando incorporamos em nossa linha de pesquisa as técnicas recentes de impressão 3D. Este é o estágio em que a pesquisa se encontra atualmente.”


E a pesquisa da equipe do professor Ganzarolli, está colhendo os primeiros resultados. “Um dos primeiros impactos que o nosso trabalho científico produziu ocorreu por meio dos pedidos de patente que depositamos ao longo da nossa pesquisa, que hoje somam quinze, das quais oito foram já concedidas.


“Estamos ainda em uma fase inicial de desenvolvimento deste dispositivo, que fez parte da tese de doutorado de meu aluno Matheus Fernandes de Oliveira. Depois de aperfeiçoarmos mais o polímero e o processo de impressão 3D, será necessário efetuar muitos testes biológicos para confirmarmos a eficácia desses stents”, comenta.


Com a divulgação destas patentes pela Agência de Inovação da Unicamp, a INOVA, os inventos atraíram o interesse da empresa de produtos médicos Scitech, que resultou em colaborações importantes com pesquisadores da área médica do Incor, no licenciamento de patentes e na captação de recursos da Finep, do CNPq e da FAPESP.


“A Química é uma Ciência central. Suas contribuições para a sociedade são imensas em inúmeras áreas, que vão da medicina aos materiais avançados usados nas aplicações aeroespaciais, passando pela geração de energia e pela produção de alimentos e fármacos. Nossa pesquisa no Instituto de Química da UNICAMP é apenas um dos exemplos de como os profissionais de Química podem interagir com profissionais das áreas médica e biológica, para gerar novos conhecimentos e contribuir para um mundo melhor”, conclui o estudioso.


Texto original publicado no site do Conselho Federal de Química.


Noticia retirada do site da Agencia de Inovação da UNICAMP

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